O que é síndrome de borderline e como agir em uma crise?

Por Dr. José Aldair Morsch, 18 de junho de 2021
O que é síndrome de borderline e como agir em uma crise?

Você já ouviu falar em borderline? Ainda pouco conhecida no Brasil, essa síndrome se caracteriza pela presença de sentimentos e comportamentos extremos, que podem se alterar de uma hora para outra.

Muitas de suas características se confundem com o transtorno bipolar, o que pode dificultar ainda mais o seu devido tratamento (que já é bastante desafiador).

Ter clareza sobre as particularidades da condição é fundamental para reconhecê-la e combatê-la da maneira correta, já que seus riscos vão desde a autossabotagem até o suicídio.

A seguir, entenda melhor as características do borderline, seus principais tipos, diferenças para a bipolaridade, sintomas, causas, tratamentos e muito mais. 

O que é borderline?

Uma boa maneira de entender o que é síndrome de borderline se dá por meio da tradução do termo, que vem da língua inglesa e se refere a algo que é “limítrofe”. 

Ou seja, é uma condição que deixa o indivíduo sempre nos seus limites emocionais, com humor e comportamentos instáveis.

Trata-se de uma doença psicológica e psiquiátrica, que gera mudanças repentinas de atitudes, as quais podem ser extremas e impulsivas. 

Assim, a pessoa com borderline pode ir de uma imensa euforia a um sentimento intenso de raiva, depressão ou ansiedade.

Já a duração dos episódios pode variar de horas a dias, e é justamente essa inconstância que dificulta o correto diagnóstico. 

Por falar na detecção do transtorno de borderline, ela é de suma importância, uma vez que ele favorece atitudes autodestrutivas.

Em decorrência da agressividade e imprevisibilidade apresentadas pelos pacientes, os tratamentos podem ser extremamente desafiadores – mas são imprescindíveis.

Isso porque a taxa de pessoas acometidas por borderline que tiram a própria vida é de preocupantes 10%, segundo dados da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) divulgados no portal Estadão.

De acordo com o artigo Borderline Personality Disorder, publicado no Nature Reviews, a síndrome atinge 1,7% da população.

Em relação aos indivíduos que já realizam algum tratamento psiquiátrico, a prevalência do transtorno é de 15% a 28%.

Quais são os tipos de borderline? 

Quais são os tipos de borderline?

Ainda que o transtorno de personalidade borderline não tenha uma classificação oficial, alguns tipos são definidos por diferentes autores para elucidar suas manifestações.

Os mais conhecidos e utilizados são aqueles estabelecidos por Theodor Milton e Randi Kreger. Confira mais detalhes sobre cada um deles: 

Classificação de Theodor Milton

O autor Theodor Milton define a síndrome de borderline em quatro subtipos, que são:

  • Desencorajado: é a condição em que os pacientes são mais isolados, esquivos e vulneráveis, com um sentimento constante de perigo ou submissão;
  • Petulante: é quando a pessoa tem padrões passivo-agressivos, sendo mais teimosas, rancorosas, desafiadoras, impacientes e pessimistas;
  • Impulsivo: como o nome indica, é marcado por comportamentos frenéticos, excessivamente caprichosos ou distraídos, indecisos, superficiais e que não suportam ser ignorados ou deixados de lado;
  • Autodestrutivo: traz uma raiva associada à autopunição, em que a tensão, o mau humor ou o conformismo geram comportamentos depressivos e até masoquistas.

Classificação de Randi Kreger

Já o autor Randi Kreger categoriza apenas os dois seguintes tipos de borderline:

  • Convencional: caracteriza-se pelos padrões mais autodestrutivos do paciente, que inclusive tem tendências maiores de considerar o suicídio ou mutilar-se;
  • Invisível: trata-se daquele menos evidente, em que o indivíduo leva uma vida relativamente normal e não é autodestrutivo, mas tende a descontar sua raiva nas pessoas com quem se relaciona, seja verbal ou fisicamente. 

Qual é a diferença entre borderline e bipolar? 

Como mencionei na introdução, em diversos casos as pessoas não percebem ou entendem a diferença entre borderline e bipolar

Muito disso ocorre por conta das características inconstantes e imprevisíveis da síndrome. Que, em situações eventuais, também pode ser confundida com outras condições psiquiátricas, como ansiedade, depressão e burnout

Contudo, ainda que possam se sobrepor, as duas doenças têm diferenças marcantes e que fazem toda a diferença para o correto tratamento dos pacientes.

Normalmente, a bipolaridade ocorre em fases distintas, que variam entre a depressão profunda e o estado de mania, que traz euforia, impulsividade e sentimentos de grandeza. 

Em determinados casos, indivíduos bipolares podem experimentar as duas manifestações no que é chamado de “estado misto”, mas os episódios duram algumas semanas. 

Por sua vez, o transtorno de borderline traz alterações muito mais rápidas de humor, com comportamentos e estados mentais flutuantes. 

Assim, a grande diferença entre borderline e bipolaridade é que os bipolares têm períodos de certa estabilidade e intervalos maiores entre suas oscilações. Enquanto isso, o primeiro caso traz suas questões negativas (seja de auto imagem, autossabotagem ou outras) constantemente. 

Definir precisamente o que é borderline é algo imprescindível para os psiquiatras, justamente por conta da segurança dos tratamentos estabelecidos.

O principal exemplo do risco relacionado a essa possível confusão é o uso de medicamentos antidepressivos direcionados ao alívio de manifestações da síndrome. Isso pode gerar episódios severos de mania nos bipolares, acompanhados de grandes riscos comportamentais. 

Principais características do transtorno de borderline 

Por mais que o borderline tenha sintomas variáveis, algumas características são comuns entre os indivíduos com a síndrome, como: 

  • Sentimento de insegurança em relação a si e aos outros;
  • Sensação de vazio e muita solidão;
  • Mudanças severas de humor, que podem perdurar por horas ou dias;
  • Flutuação entre depressão, ansiedade e raiva;
  • Irritabilidade, que pode gerar comportamentos agressivos;
  • Impulsividade, que pode ser associada ao vício em jogos ou drogas, padrões alimentares exagerados, desrespeito às leis, gasto descontrolado de dinheiro etc;
  • Pensamentos e possíveis ameaças suicidas;
  • Medo excessivo ou irreal de abandono por familiares, parceiros ou amigos;
  • Tendência ao distanciamento e relações instáveis;
  • Problemas para aceitar críticas;
  • Comportamentos irracionais em casos de grande estresse;
  • Dependência de outras pessoas para ter estabilidade;
  • Receio que as emoções saiam do controle.

Quando a doença de borderline se torna muito grave, os pensamentos negativos e o excesso de mal-estar sentido pelo paciente podem levá-lo a atitudes extremas.

Causas e sintomas de borderline comuns 

Causas e sintomas de borderline comuns

Não existem causas bem definidas para o desenvolvimento da síndrome, mas sabe-se que as crises de borderline ocorrem após situações emocionais intensas.

Esses quadros críticos tendem a ocorrer por conta de conflitos marcantes na vida da pessoa, como experiências traumáticas, separações, quase morte, falecimento de entes queridos ou mesmo abuso sexual. 

Em geral, o distúrbio de borderline é mais comum em indivíduos que cresceram em lares ou ambientes emocionalmente negativos e de afetividade conturbada.

Além de todas as características que citei no item anterior, outros sintomas comportamentais podem apontar a presença da síndrome. 

Os principais deles envolvem o excesso de irritabilidade, ansiedade, mal-estar e mudanças de humor, associados à raiva intensa e sem sentido e aos relacionamentos afetivos problemáticos e instáveis. 

Também é comum que a personalidade dos pacientes seja “8 ou 80”, em que tudo é muito intenso, impulsivo e excessivamente bom ou mau. 

Por conta disso, a compulsão por gastos, drogas, sexo, comida e vícios é comum, assim como crises de identidade, autoestima e valores pessoais. 

O estresse excessivo ainda pode gerar casos de dissociação e crises temporárias de paranoia, a depender do paciente e do quão grave é a sua situação.

Normalmente, esses sinais começam a aparecer na adolescência ou no começo da vida adulta, sendo que tendem a se estabilizar pela faixa de idade dos 40 anos.

Inclusive, é muito difícil diagnosticar o borderline na adolescência, já que essa é uma fase conturbada na vida das pessoas.

Borderline tem cura? O que fazer em uma crise? 

A síndrome de borderline tecnicamente não tem cura, mas o devido tratamento pode melhorar a qualidade de vida dos pacientes e lhes ajudar a manter relações saudáveis. 

Outro ponto importante é que as manifestações tendem a ser menores com o passar dos anos. 

Contudo, as crises de borderline podem ser muito severas, e é preciso que o indivíduo acometido e as pessoas ao redor dele saibam como agir nessas situações.

Quando a pessoa já está em tratamento, o uso dos remédios para borderline receitados pelo psiquiatra é fundamental em situações de crise. 

Além disso, o terapeuta responsável pode fornecer atendimento extra, sendo um direito do paciente ter o contato do profissional para solicitar orientações em casos de urgência. 

Por sua vez, quando não há tratamento já estabelecido, situações críticas exigem que a pessoa seja levada a um ambulatório psiquiátrico ou pronto-socorro.

Caso exista risco de vida, pode ser solicitada uma internação. Em todos os casos, cabe às pessoas manter a calma para lidar com o caso e prestar a assistência correta. 

Como saber se tenho borderline? 

Quando existir qualquer suspeita, e você ou alguém próximo note os sintomas que mencionei ao longo do artigo, é indispensável buscar por um diagnóstico especializado.

Nenhum tipo de exame de rotina, seja de imagem ou sangue, tem como saber se o borderline acomete uma pessoa.  

Contudo, uma consulta médica junto a um especialista em saúde mental pode determinar o caso, por meio da análise clínica e do histórico do paciente. 

Ao psiquiatra ou psicólogo, cabe diferenciar o borderline de outros transtornos mentais, problemas de identidade ou mesmo efeitos de drogas.

Inclusive, como a adolescência é uma fase marcada por conflitos, recomenda-se que os pacientes só tenham o diagnóstico confirmado após um ano de sintomas contínuos.

Tratamento da síndrome de borderline

Tratamento da síndrome de borderline

O tratamento da síndrome é, em sua maioria, baseado em orientações psicológicas e terapia. Mas remédios para borderline podem ser recomendados por um psiquiatra para combater os sintomas.

Nesse sentido, os fármacos mais utilizados são os antidepressivos, estabilizadores de humor e antipsicóticos.

Enquanto os antidepressivos tratam o característico sentimento de vazio dos pacientes, os estabilizadores visam reduzir as oscilações de humor.

Por sua vez, os antipsicóticos combatem os comportamentos compulsivos e autodestrutivos, além de prevenir eventuais sintomas dissociativos.

Vale ressaltar que a automedicação é absolutamente contra indicada, e que consumir medicamentos sem a orientação de um especialista pode trazer sérios riscos. 

Dito isso, uma pessoa com borderline pode realizar três tipos de terapia distintos. Confira mais detalhes sobre cada um deles:

Terapia Cognitivo Comportamental

A Terapia Cognitivo Comportamental tem como foco identificar certos comportamentos, para que a própria pessoa tente compreendê-los e transformá-los em prol de si e dos outros.

Nessa modalidade, o objetivo é diminuir o sentimento de ansiedade, dar mais controle às emoções e saber como agir perante pensamentos paranoicos. 

Terapia Familiar

Levando em consideração que os relacionamentos de quem tem borderline são muito afetados, a Terapia Familiar também é muito indicada.

Isso porque ela se volta aos relacionamentos do indivíduo, integrando os familiares no entendimento da condição e desenvolvendo técnicas para que o paciente melhore sua capacidade de comunicação e evite conflitos.

Terapia Comportamental Dialética

Por fim, há também a Terapia Comportamental Dialética, que trabalha para que a pessoa tenha plena consciência sobre si e sua condição. 

Nela, se estabelecem meios para lidar consigo mesmo, compreender as emoções, combater o excesso de estresse e desenvolver um maior autocontrole. 

Conclusão

Conviver com a síndrome de borderline não é uma tarefa fácil, dada a grande aflição que ela gera, as mudanças comportamentais que impõe, os sentimentos negativos que cria, a autossabotagem que incentiva e as dificuldades de relacionamentos oriundas da verdadeira “montanha russa” que é a condição limítrofe.

Por mais que tecnicamente não exista uma cura definitiva para o problema, os psicólogos e psiquiatras desempenham um papel fundamental para que os pacientes controlem seus impulsos e emoções. Assim, elevando sua qualidade de vida, evitando conflitos e prevenindo situações mais severas, como os pensamentos suicidas. 

Se você gostou de saber mais sobre borderline e quer se manter informado sobre outras condições de saúde tão relevantes quanto essa, continue acompanhando os artigos do blog da Telemedicina Morsch.

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Dr. José Aldair Morsch
Dr. José Aldair Morsch
Cardiologista
Médico formado pela FAMED - FURG – Fundação Universidade do Rio Grande – RS em 1993 - CRM RS 20142. Medicina interna e Cardiologista pela PUCRS - RQE 11133. Pós-graduação em Ecocardiografia e Cardiologia Pediátrica pela PUCRS. Linkedin